terça-feira, 13 de agosto de 2013

Janelas do Destino

Janelas da alma abertas de par em par. 
Amira respirava suavemente a brisa daquele momento ímpar. Duas almas e agora duas bocas unidas. O tempo parou, o corpo gelou. Mas por breves instantes a doce Amira despertou do sonho e petrificou. Era madrugada. Precisava regressar. 

Estático, extasiado com um momento tão intenso e cremoso, qual polpa de uma tâmara madura, o Sultão reclinou-se no leito carmim sedoso e adormeceu, sonhando com o toque suave da bela huri de olhos de água. O calmo e fresco manto da madrugada desceu sobre ele naquela tenda, enquanto ela, ofegante agora no seu refúgio, sentia ainda palpitante o seu peito quente, as veias vibrantes de escarlate herança.  Os lábios húmidos eram testemunho do mais doce e meloso beijo. Nem queria crer que o Sultão sentisse tamanho desejo por ela, nem ousava imaginar tal proeza. Mas era real. Os seus corações tinham vibrado unidos naquele instante, abençoados pelo ghibli que soprava na madrugada.

No dia seguinte, o sol acendeu os seus longos brilhantes castiçais e Amira saltou feliz e palpitante do seu leito. Babouchas cor de rosa e uma túnica em seda cor de jasmim bordada a flocos de ouro. O cabelo negro oculto sob um véu da mesma seda jasmim e o seu melhor sorriso. 

As ruas do kasbah nunca pareceram a Amira tão bonitas e coloridas. Só pensava nele, e cada vez mais queria ser merecedora da sua atenção.  

A vida é feita de encontros. Passamos o tempo a tentar reviver o que já foi feito, o que já conhecemos. Mas tantas vezes nos falta a ousadia de ambicionar o desconhecido. De ousar passar as barreiras do medo e as nossas próprias fronteiras gnósticas, sair do sonho e ir de mão dada com o tangível Presente.

Amira perdera-se em si mesma de deslumbre. Agora a passos pequeninos, qual criança pela mão do pai, ela deambulava entre pensamentos naquela tenda e os cheiros do kasbah. Outrora não iria sozinha, mas a liberdade que gritava o seu cerne era mais forte e ansiava era solidão.  Meditativa e radiante, cruzou o pátio da masjid pequena e sentou-se a um canto, escondida entre os verdes e azuis das colunas azulejares. 

Fechara os olhos por alguns instantes e nesse momento, longínqua memória se apoderou dela. Uma cáfila fazia a longa travessia do Sahara.  Ela, coberta de sedas e brocados e ao seu lado, num camelo, um homem cujos olhos brilhavam mais que uma estrela. Não o reconhecia, inteiramente badauii, de negro. Aquele olhar era aguçado e familiar, brilhante. Estendendo a mão para ela, alcançou-a e as suas mãos tocaram-se. De súbito, abriu os olhos e já se ouvia o adhan do muezzin Rafiq. Amira recolheu-se a um canto e com as mãos no rosto, chorou o seu Destino. Acabara de perceber que a maior felicidade do mundo era aquela que não podia ter. O Sultão era apenas um sonho nos olhos dela, nos olhos de água daquela pequena pedra preciosa.

05/12/12

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